Quinta da Pellada Revisitada

Neste Portugal à beira de um ataque de nervos, muito se fala de tecnologia, de comboios de alta-velocidade, de redes de fibra óptica. Um conjunto de ideias pré-feitas sempre com o intuito que o país consiga obter um nível de desenvolvimento mais consentâneo com o mundo desenvolvido.
Fazendo a transposição para o mundo do vinho, olhar para Álvaro Castro é como ver um TGV a passar por outros comboios que circulam a velocidade de tartaruga (bem sei que este réptil acaba por ganhar no fim...mas esqueçamos a história, certo?). Quase não tem concorrente no Dão. No entanto acredito e desejo que o panorama regional mude, se altere e que aparecem outros produtores do calibre deste senense.
Ele inventa, altera, faz coisas novas. Alugou a Passarela e criou o Pape. Já lançou um Colheita Tardia, tem um vinho branco feito de uvas tintas...Que mais irá fazer, por Terras da Serra da Estrela? Um Syrah?
Este homem do Dão, aliás ele é o Senhor Dão, não nos pára de surpreender.
Tem a sua base na freguesia de Pinhanços, concelho de Seia. Um zona com carateristicas próprias, distintas e bem definidas de todas as outras sub-regiões do Dão. Os ventos frios que vêm da serra, mais os calores que acontecem por alturas do Verão, conferem aos vinhos um carácter muito próprio.
Deste modo, irei partilhar um conjunto de apontamentos pessoais de alguns vinhos, deste produtor, e que me marcaram num passado recente. Representam, para mim, diversos patamares de evolução e criatividade. Estão no lote das melhores pingas que já provei, fazendo já parte da minha história, da minha evolução como enófilo. Não irei atribuir qualquer nota pessoal. Ficam apenas os meus registos e que me perdoem por alguns exageros ou leviandades que possam aparecer.
Quinta da Pellada Baga 100% 2000
Quem teve acesso a este vinho? Muito poucos. Eu consegui adquirir duas botelhas por mera sorte. Coisa de principiante. Feito à base de uma casta que desapareceu completamente do Dão.
Cor escura e aromas bastante diversificados, complexos e densos. Eles iam desde a fruta madura, bosque, compotas, apontamentos minerais e cacau. Poderia enumerar mais, mas se calhar não iriam acreditar...
Uma boca cheia de coisas boas. Potente, mas sem ser bruto. Estruturado. Muito complexo. Um final longo, quase sem fim. Um vinho que soube tão bem. Continua a evoluir muito bem.
Acima de tudo um Baga muito bem feito.
Quinta da Saes Estágio Prolongado 2000
Estamos perante um vinho que "é ou foi" um excelente exemplo do que pode ser uma óptima relação preço/qualidade. Ao preço que "foi ou ainda é" vendido, são poucos os vinhos que apresentam/apresentaram uma evolução digna de destaque.
Boa palete de aromas que iam desde a Ginja, frutas silvestres, caruma, musgo, terra molhada, café. Sempre numa linha fresca.
A boca sempre sedosa, envolvente, elegante e com taninos no ponto certo.
Cheguei a comprar uma caixa deste vinho, o que é raro fazer, porque o dinheiro não estica aqui por casa! Nunca me deixou mal e por essa razão ainda tenho algumas. O Quinta de Saes Estágio Prolongado 2003 está uns furos abaixo deste 2000.
Quinta da Pellada Touriga Nacional 100% 1996
Este vinho foi o ponto de partida para o estrelato (digo eu...). Quem não ouvi falar deste mítico vinho? Quase que me atrevo dizer que foi com este Touriga que o mundo conheceu Álvaro Castro.
Potência, o toque animal que lhe é tão característico. As notas de caruma, as sugestões balsâmicas, as folhas secas.
Uma boca poderosa, cheia. Fresco e vivo. A mostrar que ainda está com vida e com um futuro Uma força da natureza. Um exemplo de personalidade. Quem possua algumas garrafas que as guarde com carinho. Pois está para durar. Eu não tenho nada...

Quinta da Pellada Jaen 100% 1997
Outro marco histórico. Para mim, o melhor Jaen feito no Dão, até ao momento. Capaz de melhorar, ainda durante mais algum tempo. É raro.
Aromas são provocantes, insunantes e perfumados. Flor de laranjeira, fruta, bagas, rebuçados e chá. Tudo isto era misturado com uma pitada de notas de aniz.
Boca sedosa, equilibrada e muito elegante.
Num perfil muito aristocrático e que ajudaria a conquistar o coração de uma dama, se tal fosse necessário.

Post Scriptum: Estou a ultimar um texto sobre os vinhos que provei na Prova de Excelência, da 3ª edição Dão e Douro, no Pestana Palace. A ver vamos...

Post Scriptum: Os vinhos referidos foram provados por mais que uma vez, nos últimos dois/três anos. Cada vez que provava e reprovava, conferia o que tinha escrito. Não encontrando alterações significativas, decidi no essencial manter o que já tinha dito. Foram provados às cegas ou com o rótulo à mostra. A ideia base é transmitir as sensações e o prazer que tive, nos mais variados momentos em que contactei com os vinhos. Por isso, não atribui nenhuma nota pessoal. Como sabem estes registos valem o que valem...

Comentários

Anónimo disse…
Viva Pingus (Rui)

Parabéns,
Grande artigo sobre o Sr. Dão e alguns dos seus melhores vinhos!

Syrah não sei se o Eng. Alvaro de Castro tem, mas tem por exemplo uns pés de Merlot!!!!

1 abc,

Nuno Gonçalves

PS. PS em relação ao QP Jaen 1997 referiste que é vinho para muitos anos. Provaste-o recentemente ou a prova já tem uns anitos?
Pingas no Copo disse…
Olá Nuno, fico contente por teres descoberto este meu cantinho!

Olha, relativamente ao Jaen, provei por duas vezes. Uma em 2003 outra no ano passado. E para mim ainda está vivo.

Segundo os especialistas este Jaen de 1997 é um autêntico acaso da natureza, pois como sabes a casta em questão não é dada a grandes guardas.

Um abração
Anónimo disse…
Rui,

A razão da minha pergunta foi porque vi no outro dia à venda o QP Jaen 99 (acho que a 16/17 €) e fiquei com vontade de experimentar. Provaste este vinho recentemente ?

1 abc,

NGo
Pingas no Copo disse…
Nuno, não te posso ajudar relativamente a esse Jaen de 99. Aliás de 1999, só provei o Touriga Nacional (se não me engano).

O Jaen de 2000 ainda anda por aí. No outro dia, ainda vi umas quantas no Modelo do Montijo a serem vendidas pelo mesmo preço.