JM Grande Escolha 2003

Existem vinhos que impressionam os sentidos. Provocam, em todos nós, as mais diversas reacções. Boas, más. Não interessam para o caso. Mas vale a pena reflectir um pouco no seguinte pressuposto (sou eu que estou fazê-lo em voz alta. Ou melhor é a caneta que está escrevendo): Será que os vinhos que andamos a beber, em muitos casos, têm, tiveram como objectivo máximo, principal, ganhar uma prova de curta duração? Obter uma excelente nota, mostar o que sabem fazer perante um conjunto de juízes e depois serem (bem) vendidos? Infelizmente, ou felizmente, o dinheiro faz falta (em muitos casos, muita).
Tenho sido confrontado com inúmeros, diversos vinhos que revelam o seu potencial, todo o seu esplendor, todo o seu carácter nuns rápidos 5/10/15 minutos, como se fossem atletas de velocidade. Estarei errado? Gostaria de colocar as coisas noutra forma: Meter estes vencedores de provas rápidas em desafios de maior duração, mais longas e que tivessem de mostrar, representar vários papéis. Seriam capazes? Será que todos nós, os consumidores, ficaríamos com a mesma impressão, daríamos as mesmas notas? Hum...

O JM Grande Escolha 2003, um vinho do Douro criado pelas mãos que construíram o Oboé e o Fagote, aparenta ser um óptimo exemplo do que acabei de dizer, lá em cima. Projectado para cumprir o tal objectivo. Ficar bem classificado numa prova, onde a velocidade é fundamental. Mostrar o que sabe fazer em poucos minutos. Impressionar, fazer abrir a boca. Perfil aromático repleto de argumentos, adjectivos exóticos, diferentes. Longe do que habitualmente cheiramos e sentimos. Diria que estava perante odores vindos do oriente. Era quase impossível desviar a cara, olhar para outro lado, retirar o nariz do copo. Não dava. Aquilo era exotérico, estranho. Pouco europeu. Metia medo. No meio de todo aquele aparato, tive um pequeno momento de pausa e pensei: "Ok, belo vinho. Muito diferente. Bem feito. Estou a gostar. Mas agora se o colocasse na mesa, ao lado do prato, será que seria um bom companheiro? Será que não correria o risco de me fartar dele, de me chatear, de me aborrecer, acabando por o deixar de lado?" Voltei ao vinho, a prova dos 5/10/15 minutos ainda não tinha terminado. Havia mais para descobrir. Aproveitar em quanto dava. No entanto, não me esqueci das minhas dúvidas. Nota Pessoal: 16,5


Post Scriptum: Depois de ter lastimado a ausência de ideias, parece que o génio da lamparina me concedeu mais um desejo. Assim de repente, voltei a escrever, ou melhor, voltei a falar com vocês. Bem ou mal? Não sei, não é esse o objectivo. A ideia é mesmo partilhar o que sinto, o que acho. Bem ou mal? Não sei...

Comentários

Chapim disse…
Caro Rui,
que todas as brancas fossem como as tuas!! Bela reentrada!!

Perguntas muito pertinentes e na minha opinião existem sem dúvida mil e um vinhos que só se preocupam com a corrida dos 100mts e deixam a maratona para os pesos pesados mais antigos.

Quanto às brancas eu próprio no fácil trabalho de "comentador de posts" (lol) sinto imensas vezes brancas para comentar post dos blogs. Imagino que tendo um próprio blog e sentindo a necessidade de escrever o mais possível para os leitores estas brancas sejam muito mais difíceis de gerir. É um dos motivos que me fazem não ter um blog de vinhos.

Continua em belas provas e belos post!!
Anónimo disse…
Caro Rui o texto “A folha em branco” é um excelente texto. Prova que as dúvidas são sempre criativas. E deixa-me dizer-te que o génio da lamparina se te abandona é por muito pouco tempo. Bem-hajas pelo bem que me fazes, sempre que leio o teu blog. Tenho comentado muitas vezes, com amigos, que com a tua reflexão sobre alguns vinhos consigo saborear coisas que nunca provei. É a tal pauta de música que permite, a quem a sabe ler, deliciar-se com uns caracteres estranhos desenhados num papel, em completo silêncio. Quanto aos corredores de velocidade. Também a mim se me colocam diversas vezes essas dúvidas, por isso sempre que provo um vinho, que me espante, tento guardar uma garrafa para uns tempos depois. Tenho tido boas e más experiências. Curiosamente só o faço com os que me impressionam positivamente e seguramente que os outros, os indiferentes, podem vir a revelar-se mais tarde. O problema é o dinheiro, que faz falta, muita falta. Certos vinhos são difíceis de comprar uma garrafa, quanto mais duas. É o tal problema do enófilo, que o pescador e o político não têm. Como nunca provei o JM Grande Escolha, qual é o preço? Boas provas. AJS
Pingas no Copo disse…
AJS, o que mais odeio é ver uma folha em branco. É como olhar para algo e não perceber o que é. Terrível estar assim.

Sobre o vinho, sobre o preço dele, é coisa para custar para cima de 30/35€.

Um abraço
Presidente disse…
Tenho muito gosto em voltar a ouvir a tua música. Sim tudo o que escreves é musica para os meus ouvidos.
Cada um tem as suas opiniões. Se são boas ou más, não há que as criticar.
Dentro de cada um de nós existe um critico. Mas penso que criticas devem ser feitas aos profissionais.
E não aqueles que fazem por gosto e paixão. Não tendo nada a perder mas tudo a ganhar: novos amigos, partilhar sentimentos.