Pellada

Não farei uma inócua apresentação. Iria repetir centos de palavras que conhecem. Todos sabem que ao falar do Dão moderno, temos que pensar em Álvaro Castro. Não há volta a dar.
Numa noite foi testada a saúde de algumas garrafas da Quinta da Pellada. Tintos das colheitas de 2000, 2001, 2002 e 2003. As opções colocadas em cima da mesa reflectiam, apenas, o que existia em garrafeira. Não houve mais nenhuma pretensão.
Como sempre partilho com vocês o meus registos pessoais. Tentei ser conciso e objectivo. Evitei desvios. Os comentários, esses, ficam para vocês.

Quinta da Pellada Baga 2000
Oficialmente diz-se que nunca foi comercializado. Depois acrescentou-se que existiam vários lotes e vários engarrafamentos, que eram diferentes. Pessoalmente não faço ideia se este era o melhor ou o pior. Não tem interesse para o caso. São argumentos usados para desculpar a perfomance de um vinho ou simplesmente para fazer pirraça ao amigo. A minha é especial, a tua não é.
Este o que deu? Fruto doce, revelando face sensual, algo provocatória. Morangos e algumas groselhas. Flores de pequeno porte, juntamente com uma mão cheia de ervas aromáticas marcaram terminantemente os cheiros. Uma pitada de especiaria, aqui e além, enriquecia o conjunto. Fresco, aristocrático. Era evidente que a baga tinha sido bem educada. Sabores balsâmicos e airosos. Corpo agradável, mas indiciar que o vinho guardado nesta garrafa não ganharia em continuar fechado. Nota Pessoal: 16
Quinta da Pellada Estágio Prolongado 2000
Todas as garrafas que bebi ao longo destes anos, mostraram, quase sempre, bom nível de complexidade. Lembro-me da paixão que despertaram.
Não querendo repetir-me nas ideias (o que provavelmente irá acontecer), fiquei com ideia que as bagas envolviam-se com mimosas. Vegetal fresco. Sensação a chocolate com leite, pouco carregado. Algumas sultanas acompanharam. Sempre num registo subtil.
Sabores finos, mas com músculo. Fresco desde a entrada à saída.
O vinho contido nesta garrafa pareceu dar indicações que teria capacidade para evoluir mais um pouco. Nota Pessoal: 16,5
Quinta da Pellada Touriga Nacional 2001
Os tourigas nacionais de Álvaro Castro sempre tiveram fama. Quando falamos nesta casta, surge na memória o 1996. Bebi-o duas ou três vezes.
Este 2001 apresentava delicadeza nos aromas, com bastas sugestões florais. Algumas folhas de chá e fruta silvestre fechavam o círculo aromático. Estava fino na boca. Demonstrava, no entanto, alguma fragilidade na estrutura. A garrafa provada sugeria que a fase decrescente da vida tinha começado algum tempo. Nota Pessoal: 15
Quinta da Pellada Touriga Nacional 2002
De um ano menor. Um ano que foi catalogado como horribilis. Apesar das contingências, este Touriga está mais vivo que o 2001. Muito citrino, com notas de tanja (nunca consegui libertar-me disto). Acredito que estarei a errar no descritor. Mas não descortinei outra comparação. De qualquer modo, foi muito curioso, pois sorrateiramente irrompia ao de cima. Flores, Rebuçado. Um tinto fresco. Mais uma garrafa que deu a ideia que tinha passado o seu ponto alto de consumo. Nota Pessoal: 15,5
Quinta da Pellada Tinta Roriz 2002
Outro que surge do ano malvado. Ao contrário da Touriga Nacional, julgo que a Tinta Roriz é usada em menor escala na concepção de vinhos estreme. Não surge sozinha com tanta assiduidade. De qualquer modo, Álvaro Castro arriscou e, pessoalmente, saiu-se muito bem. Boa complexidade. Interessante escala de aromas. A tosta mostrava-se bem envolvida pela fruta, pelas flores. Passa pelo meio a pedra, o lagar. Alfazema e casca de árvore concluem o bloco. Corpo cheio, sem perder a suavidade, o aveludado. Consegue manter a frescura. Belo vinho contra todas as expectativas. Nota Pessoal: 17
Quinta da Pellada 2003
Fruta preta (Sempre tive dificuldades em definir a cor. Quando digo que é preta, dizem que é vermelha. Quando arrisco dizer que é vermelha, contradizem-me). Uma leve sensação a compota, juntamente com chocolate e fumados, reproduzia um conjunto de imagens mais modernas. Aliás, creio (é mesmo uma crença) que os vinhos de Álvaro Castro estão, agora, muito longe do que já foram. Para bem ou para o mal? Pessoalmente para o mal. Caminham perigosamente para o centro, para aquele núcleo onde todos os vinhos são iguais. A qualidade? Essa continua inquestionável. Nota Pessoal: 16,5

Em jeito de remate e apesar de todas as diferenças, ou não, notei um fio condutor, um traço familiar entre eles. Frescura, floralidade e subtileza.

Comentários

jmv disse…
Caro Pingus,

Ontem, vim aqui parar pela primeira vez, através de uma pesquisa que fiz no google sobre um vinho que me tinha enchido as medidas "quinta dos romanos". Depois foi só seguir o link e acho que me tornei um frequentador assiduo deste espaço. Ah, queria dizer que sou informático, [:))] e que aprecio muito a forma como descreves os nectares que vais descobrindo.

Apesar de ser tambem um pequenissimo produtor, (cerca de 600 litros ano), tenho uma grande curiosidade sobre o que de novo está a acontecer no douro e no dão.

um abraço
joao (Charneca de Caparica)

abraço
joao
Sempre ouvi muita gente em muito sítio falar e escrever elaborados ensaios sobre os Touriga Nacional deste produtor.

Também eu os procurei e ainda por lá os tenho, vinhos que duravam anos a fio de constante reboliço na garrafa diziam...

É um caso a pensar quando os varietais desta casta e desta casa, foram os que menos bem se comportaram.

Dos vinhos que provaste, e tendo em conta os que já provei, a minha escolha recai exactamente no Tinta Roriz.
Anónimo disse…
Eu gosto imenso do E.P. 2000 que me parece o melhor (ou o meu favorito) Pellada do sec. XXI....quanto aos restantes que provaste, os que provei, tambem me pareceram com menos dimensao quanto ao que prometiam no inicio de vida.....

Abraco
Pedro Guimaraes
Pingas no Copo disse…
Tal como o Pedro, sou um apaixonado pelos Estágio Prolongado 2000. Aliás, estou farto de falar do Quinta de Saes EP 2000.

Depois é com saudade que lembro o Quinta de Saes 1991 e 1992.