Em jeito de preparação para a semana que, segundo o calendário, começa hoje, organizam-se os instrumentos de trabalho, arruma-se a maleta, verificam-se alguns papéis, passam-se os olhos por entre decretos massudos, pesados e densos, confusos e sem sentido. São coisas de um país que já não existe, habitado por pessoas que não existem.
No meio de tal emaranhado de articulados legais, bem perturbadores, vai-se pensando ainda no que fazer, no que decidir para o futuro. E nada de suficientemente razoável se afigura. Pressente-se que a semana vindoira, trará mais semanas de semblante taciturno.
Ainda assim, e porque o vinho sugere-se, passam pela frente memórias com trinta anos. Caramba, o tempo passa e passa com enorme velocidade. Trinta anos passaram e a vida na altura, a esta distância, era bem diferente. Talvez como este vinho. Especulo.
E o vinho, talvez contra todas as expectativas, sobreviveu a três dezenas de anos. Passou por várias mãos, viveu em diferentes espaços. Ultrapassou estações do ano. Resistiu ao frio, ao calor, à chuva, à pobreza constante e à riqueza ilusória. E assim do nada, relembrei que, em mil novecentos e oitenta e três, sofria as amarguras do primeiro amor de adolescente (não correspondido). E acreditem que, para um jovem imberbe, tímido, acanhado e desastrado, não foi fácil. Não foi nada fácil.
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