Na Revista dos Vinhos, edição de Abril de 2002, nº 142, na coluna Correio dos Leitores, escrevi, em termos genéricos, o seguinte: quando leio uma critica a determinado vinho, parece-me que as avaliações e notas de prova são em muitos casos contraditórias. Porquê?
Com um pouco mais de atenção, fico com a ideia (empírica), que as notas de prova de um vinho estão intrinsecamente ligadas a um gosto ou tendência pessoal, por parte de um especialista. Isto é, será ou não verdade, se tivermos preferência por uma determinada região demarcada (acrescento: e produtor), proporcionamos quase sempre avaliações mais valorativas aos vinhos dessa região, que aos das outras?
Outra dúvida que tenho quando leio uma nota de prova tem a ver com a forma como se descreve um vinho. Por exemplo: um diz que dado vinho possui taninos vigorosos, com aromas a cacau, frutos silvestres, final prolongado e com boa capaciadade de envelhecimento. Outro diz que esse mesmo vinho possui taninos macios e sedosos, aroma a fruta fresca, final médio e aconselha a bebê-lo jovem. Aliás, na blogosfera somos confrontados diariamente com este problema. Basta recordarmos o que escrevi sobre o Quinta da Gaivosa 2003.
Um conjunto de questões que na altura me pareciam pertinentes e que passados alguns anos reparei que continuam actuais. O panorama da critica alterou-se substancialmente. Temos novos críticos, novas revistas. Vejo-me mensalmente confrontado com opiniões diversas, julgamentos díspares. Dou comigo a dizer: "Este tipo não percebe nada de vinhos. Este sim, sabe o que é bom."
Que deve fazer o consumidor, para evitar e controlar um pouco os ímpetos da crítica e não andar a correr, que nem um louco atrás dos vinhos que dizem ser os melhores?
Comentários
Por aqui (em Portugal), parece que "queremos" fugir aos assuntos. Quando se questiona o critico, o que obtemos em muitos casos é uma resposta vaga, muito pouco esclarecedora.
Dá-me a sensação, que se têm "medo".
Compreendo-te perfeitamente. Aliás, nós no vinhoacopo começámos a nossa actividade a debater exactamente este problema. Lembro-me ter publicado umas “famosas” tabelinhas Excel com comparação de notas entre os diversos guias e copiado a descrição de prova de um vinho específico (Osborne Vintage 2003) em que um crítico dizia A e o outro dizia B.
Acho que o nosso país é muito pequeno e por isso mesmo a meia-dúzia de críticos “famosos” quer agradar a gregos e a troianos. No EUA, os críticos podem-se dar ao luxo de “agradar” a minorias (nacionais e internacionais), que estas, ainda assim, são maiores que o todo português. Felizmente ou infelizmente, os nossos críticos só “trabalham” o mercado português.
Isto para dizer que, não existe solução perfeita. Cada um tem que encontrar um sistema que seja válido para si e ir ajustando através da prova.
Um abraço,
RC
Dizer a nossa opinião sobre alguma coisa não tem mal nenhum! Pode haver pessoas que não concordam, mas têm é que respeitar e aceitar (se quiserem!).
É óbvio que é complicado haver uma convergência entre todos, nós temos os nossos gostos pessoais, é uma variável que temos que ter sempre em conta.
Para mim qualquer opinião tem o seu valor, e ainda bem que existe opiniões diferentes, nós somos todos diferentes, ou não!
Esta parte do post do Kroniketas é interessante.
No entanto, gostava era de pensar na hipótese, mesmo muito hipotética que seja (desculpem a repetição), de os criticos assumirem os seus gostos e tendências. Seria possível? Mas como diz o Rui (vinhoacopo) a nossa critíca vive exlusivamente do nosso mercado (para o bem e para o mal)...
Já o José António Salvador, que se deixou de fazer roteiros de vinhos, tinha uma apreciação mais virada para si mesmo, o que para um crítico foge um pouco ao interesse dos consumidores. Ouvi-o dizer que gostava de vinhos de ruptura e que achava os vinhos do Alentejo demasiado fáceis, o que não é necessariamente um defeito, mas para ele pelos vistos era. O que é preciso é encontrar o ponto de equilíbrio entre o gosto pessoal do crítico e a orientação que deve ser dada ao leitor/consumidor. Porque ao fim e ao cabo é para este que eles escrevem.
Assumo que foi durante muito tempo (e ainda, pois leio as suas crónicas na Visão) o meu "guru".
De qualquer modo, continuo apreciar o estilo e identifico-me em grande parte com o seu gosto.
Por exemplo quando estou a falar com um dono de um restaurante pergunto-lhe que vinhos gosta mais, e os vinhos que ele me vai dizendo vão "caindo" em "niveis" ou "caixas" que eu proprio as criei (de forma empirica assumo) de vinhos com caracteristicas similares, de tal forma que no fim consigo sugerir - dos vinhos que vendo, vinhos que vão ao encontro do paladar do dono do restaurante.
Se ao menos o J.P. Martins e outros nos pudessem perguntar que vinhos gostamos mais......
É que podemos -nós- não gostar de um vinho, mas dizer que não é bom ou que não presta vai uma grande distancia.
confesso que ás vezes fico na dúvida com alguns dos nossos mais famosos criticos. Se fazem a critica conforme o seu gosto pessoal ou se conforme a qualidade do produto.
Exemplo practico - eu não gosto do vinho Charme, mas não me atrevo a dizer que não presta. Até porque me parece que a madeira por onde passou é de altissima qualidade e a fruta presente das melhores, mas eu não gosto mas no entanto o vinho ... é bom!
e agora?
Estou a recordar-me mais uma vez do Gaivosa (já provei o 99, 00 e 03). Pessoalmente, até à data, nunca lhe encontrei grande graça. No entanto vejo por aí, muitos e variados elogios, provavelmente com razão. Eu é que ainda não lhe apanhei o jeito.
Acontece que o cinema é mais visível enquanto espaço de crítica (talvez mais antigo e mais vasto) e assume-se mais facil e abertamente a componente pessoal do crítico. Por cá, a aura de distância que o crítico assume face ao «produto» coloca-o num pedestal de autoridade que poucos ou ninguém ousa questionar, duvidar ou contestar... a começar pelos próprios produtores, embora à boca pequena o comentem, mas muitas vezes não revelando nomes. Os críticos têm nariz e boca como todas as outras pessoas, têm também um gosto pessoal e direito à opinião. O que é lamentável é que não se assuma o gosto pessoal inscrito na crítica. É pena que se duvide que há uma enorme componente de gosto pessoal na crítica.
Não vejo mal nenhum nisso. Penso é que é preciso ter noção da realidade. Voltando ao cinema, onde a crítica é mais pluralista: Veja-se a tabela das estrelas, há filmes simultâneamente com uma estrela e quatro estrelas. Estão os críticos a classificar o mesmo filme? Estão apenas a restringir-se a aspectos técnicos? Os críticos de vinho são absolutamente diferentes dos outros críticos todos? Só os críticos de vinho portugueses é que são diferentes?
"(...)há filmes simultâneamente com uma estrela e quatro estrelas. Estão os críticos a classificar o mesmo filme? Estão apenas a restringir-se a aspectos técnicos? Os críticos de vinho são absolutamente diferentes dos outros críticos todos? Só os críticos de vinho portugueses é que são diferentes? "
Esta passagem da sua autoria é o ponto fulcral da questão, para mim.
Um abraço
Abráços.